Maurício Palma Nogueira responde à pergunta e mostra o potencial da pecuária bovina tropical com o emprego de um pacote tecnológico similar ao da soja
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Por Maurício Palma Nogueira
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Uma das maiores falácias criadas pela desinformação que margeia as discussões sobre sustentabilidade está relacionada ao consumo de carne.
Ideologias, preconceitos, modismos e oportunismo criam bases para um mito que ganha cada vez mais força entre a sociedade de maior poder aquisitivo. Esse mito aponta que o consumo de carne bovina se contrapõe à sustentabilidade do planeta. Em tese, seria necessário desmatar extensas áreas para atender a demanda crescente.
Estudos incompletos e embasados em premissas equivocadas associam erroneamente a relação entre desmatamento e pecuária. Essa relação existe, mas o erro está na diferenciação entre causa e consequência.
A comunicação oportunista de empresas, posicionada em produtos substitutos às carnes, também reforça a onda de desinformação em torno do assunto.
Somando todas as forças, gera-se um fluxo intenso de artigos, opiniões, documentários, filmes, entrevistas etc. Tal qual o estouro de uma boiada, a opinião pública vai sendo empurrada numa única direção que não permite enxergar a mais óbvia das conclusões. A relação humana com o consumo de proteína animal é inseparável, tanto é que cerca de 800 milhões de pessoas se alimentam diariamente de animais silvestres.
Esse montante equivale a pouco mais de 10% da população mundial e se concentra basicamente na Ásia e na África. Aglomerações inadequadas de animais silvestres, sem nenhuma garantia sanitária, é consequência dessa demanda. E são situações como essas que potencializam o risco de surgimento de um novo problema como o de Wuhan, na China, provável origem da pandemia.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) projeta uma queda de quase US$ 4 trilhões de dólares na economia entre 2019 e 2020, como consequência da pandemia. A destruição da economia global em um ano será três vezes maior do que o tamanho da economia brasileira. É como se três brasis desaparecessem do mundo em um ano. Se analisarmos a histórica recente, não há evento individual mais impactante do ponto de vista de sustentabilidade do que a ocorrência da pandemia e os efeitos colaterais gerados.
A ironia é que, enquanto uma elite global discute e se empenha em dificultar a disponibilidade de proteína para os habitantes do planeta, é justamente a solução encontrada pelo homem comum para driblar essa indisponibilidade que está entre as causas do maior impacto causado à sociedade em tempos de paz. Vale exercitar aqui a lembrança de que o conceito sustentabilidade envolve economia e sociedade.
E o risco será maior nos próximos anos. Os números projetados pelo FMI para 2025 mostram que a economia nos países fora da OCDE (Organização para Cooperação Desenvolvimento Econômico) será de US$47 trilhões, equivalente a toda economia mundial de 2005. A OCDE reúne os países mais ricos do mundo.
A demanda por proteína será grande. Se a demanda não for suprida com qualidade e garantia, ela será buscada na natureza, com seus consequentes impactos. Frear essa demanda é um despropósito que só poderia ser implementado através da força ditatorial.
Mas fica para o final deste artigo a boa notícia. O potencial de produção de carne é maior do que acreditam os especialistas em projeções. Tivessem eles o cuidado de conhecer o desenvolvimento das tecnologias já implementadas a campo, compreenderiam que o Brasil sozinho seria capaz de suprir quantidades até maiores do que toda a oferta global de carne bovina atual.
Se a pecuária brasileira aplicasse, em média, o mesmo pacote tecnológico proporcional ao aplicado na cultura da soja, a quantidade de carcaça (carne com osso) produzida por hectare saltaria de 67 kg para 510 kg por hectare / ano. Os dados são referentes à média de cinco anos de pesquisas conduzidas a campo pelas equipes do Rally da Pecuária, expedição técnica privada que avalia as condições da bovinocultura de corte no País.
Nesse nível, apenas o Brasil, ocupando os atuais 164 milhões de hectares de pastagens, seria capaz de produzir 83 milhões de toneladas de carcaça, sendo que o mundo todo produz, atualmente, 72 milhões de toneladas. E ainda tem potencial para mais.
Essa realidade já está no campo e é fruto do trabalho conjunto entre a pesquisa agropecuária brasileira e o empreendedorismo da iniciativa privada, seja nas fazendas ou fora dela.
O empenho em limitar o consumo de carne bovina, além de ser embasado em falsas informações, irá gerar um risco enorme para os próximos anos. É para se refletir.
* Maurício Palma Nogueira é engenheiro agrônomo, diretor da Athenagro e coordenador do Rally da Pecuária.
Nota: Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do Estadão.